
Foi com enorme satisfação que estive na abertura da mais recente exposição do artista plástico Flávio Tavares, em mais uma edição do primoroso projeto SESC Grandes Nomes. Além da homenagem, mais que justa, ao talento e à trajetória de um dos maiores nomes do cenário das artes visuais no país, a mostra nos relembra do inesgotável universo de Flávio, capaz de propor novas leituras e vislumbres de seu repertório artístico. Senhor de uma técnica já maturada e em pleno domínio da linguagem do desenho e da aplicação de cores sobre suportes tão diversos quanto tela, cerâmica ou madeira, Flávio trouxe para o espaço do SESC uma espécie de matriarcado mítico, onde a mulher e a mãe-natureza formam a simbiose e a síntese de um mundo ordenado.
Sua obra se caracteriza por um traço vigoroso, ao mesmo tempo delicado, que transmite uma força expressiva ímpar. Flávio retrata com grande sensibilidade suas figuras humanas, às vezes surreais, de rostos anônimos, que compõem o tecido social. Seus personagens são muitas vezes retratados com uma forte carga emocional, revelando a luta, a resistência e a dignidade em cenas que capturam o drama e a beleza da vida comum. Já em uma série de jarros de argila e pranchas de madeira, seus personagens são avatares de uma inteligência primeva, ancestra; estão despidos de vestes, como legítimos nativos de uma nação imaginária de sabedoria atemporal, amazônica, imbricada com elementais da natureza.
Flávio segue múltiplo em sua linguagem. Há uma peça em cerâmica esmaltada que simula uma “paixão” no sentido bíblico, vias de sofrimento, embates e redenção, em prato-mandala que emana religiosidade e drama. Bem ao lado, estão – pintadas sobre longos recortes de madeira – senhoras distintas em seu ar aristocrático, como se saídas de um antigo álbum de memórias. Presença obrigatória quando se trata de Flávio, duas belas pinturas de grande formato também podem ser vistas na mostra. Afinal, como muralista, Tavares deixou sua marca em diversos espaços públicos, contribuindo para a democratização da arte ao levar suas criações para além dos limites das galerias. Sempre é importante registrar que Flávio é um artista profundamente conectado com suas raízes, mas cuja obra transcende a dimensão regional, dialogando com questões universais.
O grande número de pessoas na abertura é um atestado da importância, prestígio e relevância do artista na cena cultural e social do Estado. O deleite desse programa cultural foi ainda mais gratificante pelas luxuosas companhias de minha mãe, Dona Eulália, e de meus sobrinhos, Pedro e Marina. Não é toda semana que a arte pode ser partilhada em família e em nível artístico como o proposto por Flávio Tavares. Convido a todos a não perderem a chance de ver o que o SESC Paraíba está expondo em seu espaço na praia de Cabo Branco.
Artigo de Vladimir Neiva